CINEMA



Biutiful

Realizador: Alejandro González Iñárritu

Actores: Javier Bardem; Maricel Álvarez

                O cenário deste filme é a Barcelona underground do século XXI, com as máfias chinesas em acção, a exploração do Homem pelo homem, a corrupção policial, os esquemas de sobrevivência dos imigrantes ilegais de origem africana em busca do direito a uma vida mais digna e a sobrevivência dos nativos à custa destes mesmos esquemas.
                As crianças, filhas de Uxbal (Bardem) ainda transportam com elas alguma esperança e alguma pureza em relação ao futuro. Os adultos carregam o fardo da derrota e da miséria, mesmo que camuflado por dinheiro.
Bardem veste o papel de um homem entre os 40 e os 50,  em conflito interno para se reconciliar como o passado e com o presente. É pai semi-solteiro de duas crianças e mantém a responsabilidade de cuidar da ex-mulher, que sofre de síndrome da bipolaridade. Uxbal descobre que está em fase terminal de cancro e não sabe como cuidar do futuro dos que  dele dependem. É um homem atormentado pela morte, a sua mediumneidade faz-lhe saber que a passagem para o outro lado só é bem conseguida se tudo ficar resolvido deste.
O filme retrata os dramas que assolam a família de Uxbal e o próprio, desde a morte do pai, que fugiu da Espanha franquista acabando por morrer de pneumonia duas semanas depois, até à morte da mãe ainda muito jovem, tão jovem que não se consegue lembrar do seu rosto. Com os filhos mantém uma relação calorosa, sente-se que os ama verdadeiramente, em relação à mulher sente-se o peso da fracasso, não consegue conviver com a sua bipolaridade mas continua a ama-la. Os imigrantes, tanto os africanos como os chineses, provocam-lhe um intenso conflito interno, não aceita as más condições em que vivem, ou melhor sobrevivem, mas sabe que são eles a sua fonte de rendimentos. Numa frágil tentativa de lhes minimizar o sofrimento acaba por provocar uma tragédia brutal. Quando a sua vida se aproxima do final é numa imigrante ilegal que vai confiar para cuidar do futuro dos filhos e para o ajudar na difícil tarefa de morrer.
Bardem é um actor excelente, com uma capacidade para vestir diferentes papeis pouco usual mas, na minha opinião, o registo que melhor encarna é sem duvida o trágico. Será pela sua fisionomia, pelos seus olhos que carregam uma tristeza quase intrínseca, e que quando sorriem iluminam completamente o rosto, ou apenas porque sim, mas sejam quais forem os motivos é sem dúvida um actor muito bom. Este desempenho é apenas mais um nessa senda de excelência.
O argumento deste filme é muito bom, sem melodramas vulgares e enjoativos mostra-nos realidades difíceis de aceitar, sobretudo nesta nossa sociedade consumista. Deixa um bom ponto de partida para reflexão individual
Anabela 




La leggenda del pianista sull'oceano"
Este é o titulo original de um dos melhores filmes que em 2013 ano. O filme data de 1998, portanto uma relíquia do século passado, só tardiamente nos chegou e por recomendação, pouco recomendada, diria. Só vimos por curiosidade de saber o que tinha encantado a quem nos recomendou. É de facto um filme que encanta.
Comecemos pela cor sépia que nos empurra para cantos da nossa memória que não existem mas se existissem teriam aquela cor, aquele dourado que o tempo põe nas memórias, que as torna nostálgicas e doces mesmo quando o conteúdo é amargo e duro.
O filme começa com um homem a despedir-se do seu último bem, uma trompete, com história, a que lhe deu e a que já tinha quando a comprou. É notória a dor da despedida, mas também a necessidade imperiosa de fazer dinheiro, que obrigam a uma venda menos digna. Em jeito de despedida o musico pede para tocar mais uma vez e o som  que lhe sai da alma leva o velho dono da loja até uma velha grafonola onde coloca um disco-matriz com um som fenomenal, que achou num velho piano que havia comprado da liquidação do recheio de um barco. Segundo o musico o som que se ouviu saiu das mãos do melhor pianista de todos os tempos. A partir daqui vai, em analepse, contar a história de 1900, um homem com um dom para a musica que só poderia ser divino uma vez que nunca  aprendeu musica em lado algum e que nunca colocou os pés em terra.
 A bordo de um transatlântico, no ano de 1900, um dos marinheiros responsável pelas caldeiras prospecta moedas ou outros valores na sala de festas, após o encerramento da viagem. N encontra um cêntimo, mas em cima do piano, dentro de uma tosca caixa de limões está um bebe recém nascido ou com poucos dias, sem nada que o identifique. Decide ficar com ele e vai nomea-lo da forma mais estapafúrdia possível, depois do seu nome, Danny Boodmann, acrescenta o nome da empresa de limões, TD Lemons e o ano, 1900. A criança fica com um nome louco, Danny Boodmann TD Lemons Nineteen Hundred. Assistir ao crescimento do bebé, alimentado/criado por um bando de marinheiros completamente brutos, mas suavizados pela doçura da criança, assistir às suas aprendizagens muito precoces na leitura e às gargalhadas de seu pai quando lhe lê as noticias sobre as corridas de cavalos, à forma como cativou toda a tripulação, inclusivé o comandante do navio enquadra-se perfeitamente na tal cor sépia dominante. A  vida do pequeno tem alguns sobressaltos sendo o maior a perda de seu pai num acidente de trabalho. Na enfermaria o pequeno vai ler o jornal ao pai que morre a rir ou de tanto rir… a par da vida de Danny 1900, vamos vendo as assimetrias nos viajantes, as zonas de ricos,  o luxo e glamour, as zonas de pobres apinhados, a dormir em camaratas com dezenas de beliches, mas com o sonho americano estampado no rosto. De menino clandestino, órfão - ele pensava que os órfãos eram os adultos sem filhos -  Danny passa a integrar a orquestra do navio quando descobre o talento incrível que tem para a música. Nessa orquestra deixa o maestro sempre à beira de um ataque de nervos e o seu amigo Max, que embarcou em 1926, feliz da vida. Depois que os acordes do seu piano o desligam do mundo a musica sai ao encontro de quem vai vendo, cada pessoa lhe dita umas frases, pelo seu aspecto, pela sua fisionomia, pelas carrancas ou sorrisos, pelas desconfiança, pela timidez, pelo ar comprometido, é sempre de alguém que a musica sai para ir ao encontro do pianista e seu piano.
O facto de nunca ir a terra, por medo, medo da vastidão, da não integração, do tamanho desmesurado de tudo o que teria pelo frente (sente isto quem toda a vida andou pela imensidão do mar!) cria à volta deste homem um certo ar, quase uma aura e um belo dia é desafiado pelo maior músico de jazz de Nova Orleães, vai-se divertir à custa dele, parafraseando, nota por nota, o seu trabalho, no desafio final derrota-o de forma espectacular. Max vai contando a história, o espectador vai-se rindo, o antiquário vai mostrando todo o seu cepticismo e fica-se a saber que o barco onde Max tanto tocou,  está para ser destruído ali bem perto. Max sabe que o amigo está lá dentro e vai tentar parar a destruição, consegue retardar, encontra o amigo mas não o consegue fazer sair daquilo que foi o seu continente, o seu país, a sua cidade, a sua casa durante toda a vida.
Este filme retrata sentimentos, amor, amizade, criatividade, tristeza, dor, perda, encontros,  desencontros. Sente-se isso na matriz partida, salva por milagre ou Max, que seria a porta para a riqueza de 1900 e dos produtores, claro, mas que nunca saiu do barco porque o musico não queria que a sua musica fosse ouvida sem ele estar presente.
Filme a ver ou a rever…
Tim Roth talvez no seu melhor…



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